segunda-feira, 17 de setembro de 2007

A Idade da Terra*

Como poderiam a teoria da Evolução e a Física, ramos da ciência aparentemente tão distantes, contribuírem para a determinação da Idade da Terra? Ao final deste texto descobriremos suas conexões, mas vamos começar falando um pouco sobre a “caminhada” de Darwin em direção a teoria sobre a origem das espécies que habitam nosso planeta.

A evolução da Evolução

Ao contrário do senso comum, muitas das descobertas do mundo das ciências não ocorre por “revelação”, ou seja, o pesquisador não acorda uma manhã com toda a teoria formada (salvo algumas folclóricas exceções). Ela na verdade é fruto de muito trabalho, tempo, troca de ideias e por que não dizer influências ou inspiração vindas de outras fontes. Este é o caso de Darwin. Foi dentro do Beagle, o navio que levou Darwin a dar a volta ao mundo em uma missão geográfica da coroa britânica, que teve contato com uma de suas maiores, se não a maior, influência, o livro “Princípios de Geologia” de Charles Lyell. E foi munido das ideias de Lyell e de seu interesse por cada criatura e planta que encontrava que Darwin percorreu durante 5 anos a América do Sul, Pacífico e Oceano Índico colocando-as em teste.

A comprovação das observações feitas por Lyell de conchas marinhas no alto de montanhas no Chile, a observação da elevação do solo por um terremoto e a formulação de uma teoria dos atóis no Pacífico, originadas segundo ele de vulcões que desmoronaram e depois confirmadas pelos testes nucleares na região, foram alguns dos elementos que o levaram a escrever “A Origem das Espécies”. Assim, como vários pesquisadores de sua época, Darwin “entrou criacionista” no Beagle, e saiu com dúvidas, depois de ver tudo que viu.

Mas a teoria como foi apresentada não nasceu na viagem em si, mas também em leituras antes e depois desta. Seu avô, Erasmo Darwin, já havia elaborado um tratado com ideias sobre a possibilidade de que os seres vivos poderiam ter se originado de um ancestral único, além de estar a par das idéias de transmissão das características adquiridas em vida para a prole, defendida por Jean Baptiste de Lamarck. Também conhecia os trabalhos do economista Thomas Malthus sobre a tendência da maioria das espécies de se reproduzir além da capacidade do meio ambiente, além do livro de Lyell, é claro, já citado anteriormente.

Podemos expressar sua teoria em três premissas e uma conclusão:

  1. Cada membro de uma espécie é diferente do outro. Estas diferenças geralmente são mínimas, sutis, mas que podem, em certos casos, beneficiar um membro mais do que outro.

  2. Todas as criaturas vivas tendem a produzir mais descendentes do que o ambiente pode sustentar.

  3. As diferenças entre indivíduos, combinadas com as pressões ambientais, afetam a probabilidade de determinado indivíduo sobreviver o bastante para transmitir suas características genéticas.

A conclusão é que a seleção natural leva à origem de novas espécies.

Porém esta origem se dá após muitas gerações de indivíduos dentro da mesma espécie, que ao se tornar cada vez mais e mais diferente do ramo primordial acaba por não mais conseguir gerar proles férteis ao se acasalar com parentes de outros certos grupos. Neste ponto Darwin estabeleceu que uma nova espécie surgiu.

“Durante a modificação dos descendentes de qualquer espécie, e durante a luta incessante de todas as espécies para aumentar seus números, quanto mais diversificados se tornam os descendentes, maior será sua possibilidade de êxito na luta pela vida. Assim, as pequenas diferenças que distinguem variedades da mesma espécie tendem a aumentar constantemente, até igualar as diferenças maiores entre espécies...”

Os receios, a publicação e as críticas

Apesar da essência de sua teoria estar pronta num ensaio de 230 páginas em 1844, postergou sua publicação durante 15 anos. São muitas as especulações sobre tal relutância em publicar o trabalho, como seu estado permanente de enfermidade (Especulações sobre seu constante estado de doença é que um inseto que o picou na América do Sul “grande inseto negro dos pampas tivesse lhe transmitido a doença de chagas), mas o mais provável é que Darwin temia uma reação enérgica das opiniões contrárias, principalmente da Igreja.

O fato decisivo veio com uma carta em 1858 de um naturalista chamado Alfred Russel Wallace, que empregou uma viagem nos moldes da que o próprio Darwin fez e chegou a conclusões muito parecidas, enviando-lhe um esboço de seu trabalho.

Assim Darwin se sentiu no momento, também influenciado por Lyell e Hooker, a finalmente publicar seu trabalho, um livro extremamente detalhado e “auto-consistente”. Logo vieram as críticas como esperado, principalmente da Igreja, mas como cita Ferris “em grande parte tão retórica que passou à volta da Origem como água em torno de uma pedra”. A teoria da evolução então trouxe mais um elemento ao tema “a idade da Terra”, já que esta exigia não milhares, mas milhões ou bilhões de anos.

É interessante observar que Darwin era tido pelo pai e por alguns professores como “preguiçoso”, que gostava apenas de diversão e colecionar pedras, plantas e insetos, e que, segundo seu pai “será uma vergonha para você mesmo e toda a família”, e até hoje falamos dele!

Porém, segundo Ferris, “Embora a evolução de Darwin e a geologia de Lyell deixassem implícita a velhice da Terra, não a provava. Esta tarefa coube as físicos [...]” e esta se deu inicialmente pela termodinâmica.

Grandes mentes sobre um grande problema

A idéia geral de se utilizar a termodinâmica para a datação da idade da Terra é assumir que esta teve origem como uma massa incandescente, e que vem se resfriando através dos séculos. As primeiras experiências com este enfoque remontam de 1770 mas com resultados muito imprecisos (estimativa de cerca de 168.000 anos no máximo) e no século XIX nomes de peso da física se debruçaram sobre o problema (Lorde Kelvin, Hermann Von Helmholtz, Rudolf Clausius, Ludwig Boltzmann), porém com foco de estudos não na Terra, mas no Sol.

Estudar o Sol era supor que este e a Terra foram formados aproximadamente ao mesmo tempo. Helmholtz propôs que a energia que fazia o Sol brilhar era a contração gravitacional, estimando sua idade entre 20 a 40 milhões de anos. Apesar das novas estimativas de tempo serem muito maiores, os defensores da Evolução precisavam de muito mais tempo, porém Lorde Kelvin com sua autoridade e nome defendia tais idéias, apesar de considerar a possibilidade de que a contração gravitacional não fosse a única força atuante no Sol: “não digo que não possa haver leis ainda não descobertas”.

Mas eis que as descobertas sobre a radioatividade a partir de 1895 com Conrad Röntgen, Becquerel, os Currie, Ernest Rutherford e outros vieram a preencher a lacuna que Lorde Kelvin havia “profetizado”! O Sol se mantém ativo pela ação da força nuclear forte, envolvida no processo de fusão nuclear principalmente do hidrogênio e hélio, e que o tem mantido por cerca de 5 bilhões de anos. A desintegração nuclear, ou radioatividade, de outra forma, mantém a Terra aquecida, além do núcleo em fusão do globo.

Juntamente com estas descobertas abriu-se um novo campo de pesquisa, a datação por radioatividade, tanto de pedras como de material orgânico (por carbono 14). Na atualidade assume-se como aproximadamente 4,6 bilhões de anos a idade da Terra, obtida através da datação de rochas lunares.

Desta forma a evolução de Darwin e a Física, juntas, tornaram auto-consistente a idéia de que a Terra é muito mais antiga do que poderia se imaginar.

*Este é o título original dado por Timothy Ferris no capítulo 13 de seu livro.

Referência: Timothy Ferris, O despertar na Via Láctea – Uma história da Astronomia, Editora Campus

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